quinta-feira, 10 de março de 2011

O submarino portenho

Fachada do Café


O Centro de Buenos Aires deixava escapar um calor familiar. Suados, cansados e com as garrafinhas de água mineral vazias olhávamos, já sem muito ânimo, a lista de coisas para ver e fazer. Foi quando entramos no London City, tradicional café portenho imortalizado por Cortázar em um de seus livros.

Até ali tínhamos resistido aos cafés espalhados pelas esquinas da cidade – alguns pelos preços outros porque nos pareciam menos glamorosos do que aqueles que havíamos escolhido para conhecer. Encontrar o London City, portanto, provocou em mim uma alegria indisfarçável: Finalmente eu tomaria um café portenho! E em um salão fumador.

Sobre isso, preciso dizer que poderia listar uma série de hábitos que me encantaram na velha cidade, como as ruas largas tomadas por transeuntes passeando com seus cães; os septuagenários nos restaurantes noturnos apreciando vinhos em meio a conversas e as pessoas que, solitariamente ou em grupo, caminham tranquilas pela madrugada. Mas nenhum desses me fez sentir mais livre do que poder sentar em uma mesa, tomar um café e acender um cigarro.

Preocupada com a perseguição cada vez maior aos fumantes, cheguei a pesquisar, antes da viagem, como os portenhos estavam se virando para frear a fumaça em bares e cafés. Descobri que uma nova lei impedia-os de acender seus cigarros em ambientes fechados. A proibição provocou a ira de estabelecimentos tradicionais que, anos antes, investiram para adequar seus espaços a uma lei anterior – os cigarros poderiam ser acesos desde que o local tivesse um lugar reservado para a clientela fumante.

Nada mais natural, portanto, que eu chegasse precavida. E resistisse, ao menos nos primeiros dias, à tentação de acender o cigarro. Mas logo percebi que era tolice porque os portenhos, além de notívagos, são fumantes profissionais. Tanto que não foram poucas as vezes que, após indagar ao garçom sobre a possibilidade de acender o meu, ouvi como reposta: Sí, ¿Cómo no?

Falando em garçom, lembrei-me da razão desta crônica. Sentados no fumador do London City, com um ar-condicionado que nos fazia esquecer a temperatura lá fora, folheei o cardápio com olhos de criança. Buscava, nas opções de cafés, algo que não soasse somente como um capuchino ou um café com creme. Meus companheiros, meio cansados de aventura, pediram logo um suco e um café.

Foi quando vi o submarino, acompanhado de três medialunas. Contente por não segurar por mais tempo o garçom, avisei-lhe da escolha e ele me respondeu sorridente, mas espantado: ¿Un submarino?!Perfecto!

A verdade é que não fazia ideia do que era o submarino e não me ocorreu perguntar antes. Não somente por esquecimento, mas porque me pareceu que um nome charmoso como este, merecia o gosto do desconhecido.

Tal espírito guiou-me os primeiros segundos frente à xícara, de onde se via um líquido branco, fumegante, quase espumoso. O cheiro não era desconhecido e o sabor, aliado às barras de chocolate depositadas no pires, atiçava minha curiosidade: que mistura será esta? Terá cherry brandy, conhaque ou outro licor qualquer?

Não. Era somente leite – e eu nem gosto de leite puro! A constatação me fez chamar na hora o garçom. Queria saber o motivo de seu espanto quando pedi o submarino. E ele, simpático como poucos portenhos, respondeu-me com um largo e divertido sorriso: Pedir un submarino en verano es lo mismo que entrar en un horno, ¿no?

3 comentários:

eduengler disse...

mi amigo salió de la sartén y luego entró en el horno.

Cristina Lopes disse...

Gostei muito do seu post. Abraços de outra blogueira.

Vássia Silveira disse...

Sí, edu, ocurrió lo mismo conmigo! Cristina, obrigada pela leitura. Abraços!