quinta-feira, 15 de julho de 2010

Acabou?

Mário Pereira

Pego o primeiro ônibus às 11h30 da manhã. O coletivo segue vazio, assim como as ruas da cidade. Aqui e acolá o que se ouve são as vuvuzelas dos torcedores que não se atrevem a desviar os olhos dos aparelhos de televisão, apesar do churrasco, da cerveja, do tempo passando lá fora. Não, não sou patriota. Foi o que respondi a um colega que, assombrado, perguntava sobre meu desinteresse pelos resultados dos últimos jogos.

O caminho do primeiro ônibus é o que mais me agrada. Não somente por que segue a estrada aberta no morro, margeando, do alto, o mar, mas principalmente porque é lento e entrecortado. Na maioria das vezes, me permite viagens a mundos tão distantes que é custoso despertar para a troca de coletivo no Terminal do Rio Tavares, o que normalmente acontece uns 30 minutos depois – se não houver fila, um eufemismo do morador de Florianópolis para os intermináveis engarrafamentos.

Ao subir no segundo ônibus, penso que a grande vantagem da final é deixar mais tranquilas as ruas: em 20 minutos chego ao centro da cidade. De lá, é só apanhar o Volta ao Morro, Saída Norte, e mais 30 minutos, estou na Trindade. Que maravilha! Todo o percurso em uma hora e vinte minutos! Um recorde para quem, normalmente, gasta duas horas para cumprir o mesmo trajeto.

No Terminal do Centro, os motoristas e cobradores amontoam-se nos quiosques de lanche e acompanham, aflitos, os momentos finais do jogo Brasil e Holanda. Não demora, um homem branco de olhos azuis chuta a poeira invisível no caminho até o veículo, sobe os dois degraus, passa por cima do motor, senta na poltrona coberta por uma manta verde e roda a chave na ignição.

Atrás dele, nós, os poucos passageiros, e o cobrador. A moça entra balançando a cabeça, o olhar perdido e a frase pendurada no nada: Acabou, acabou. Ela me olha e eu, sem graça, tento encontrar palavras que diminuam sua frustração. Incorporo, então, uma torcedora desiludida. Solto frases sem nexo, dessas que não buscam explicação, querem apenas existir, com seu efeito placebo, na brevidade dos sustos: Que coisa, né? Inacreditável! Que tristeza! Faltava tão pouco...

A moça segue inconsolável. Diz que agora não tem outro remédio: o melhor é dedicar-se ao desenho, ganha mais com isso. Eu, já sem frases de efeito placebo, fico aliviada ao perceber que do outro lado da fila de cadeiras há um torcedor como ela, desenganado. Deixo, então, que ambos se consolem. E sigo com a certeza de que em todo o fim, há um começo.

Pouco depois, desço do ônibus, caminho até a imobiliária, apanho as chaves, entro no prédio, subo as escadas e abro a porta do novo lar.

A vida está só começando. De novo.

Um comentário:

eduengler disse...

O quinto parágrafo me deixou boquiaberto.
Amei.
e Sem efeito placebo, posso lhe dizer minha amiga, bati o recorde uma vez no madrugadão, 30 minutos de sul a centro.
Creio ser um sansara bom este de ser patriota pelo jogo.